A decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) de manter o leilão do Tecon 10 em duas fases, proibindo os operadores já presentes no Porto de Santos de participarem da primeira etapa, marca uma inflexão importante na política portuária brasileira. Pela primeira vez, um mega terminal estratégico, capaz de ampliar em até 50% a capacidade de movimentação de contêineres do maior porto da América Latina, será oferecido com um modelo explícito para atrair novos players globais e reduzir o risco de concentração.

Num setor historicamente dominado por poucos gigantes, a medida não é apenas regulatória: é uma tentativa concreta de baratear o custo Brasil, ampliar a concorrência e abrir espaço para investimentos privados de longo prazo.

Por que o modelo em duas fases é positivo

Aumenta a competição real no maior porto do país.

Os grandes operadores de Santos, empresas gigantes como MSC, Maersk, CMA CGM e DP World, já concentram uma enorme parcela da movimentação. Se entrassem imediatamente no leilão, tenderiam a manter essa concentração.

Ao vedar a participação dos incumbentes na 1ª fase, o TCU:

  • evita oligopólio,
  • estimula competição entre novos grupos,
  • reduz risco de integração vertical excessiva com armadores.

Isso é crucial para tarifas mais equilibradas e melhor qualidade de serviço.

Atrai capital novo para o Brasil

Portos internacionais têm apetite por ativos logísticos de alto potencial, e o Tecon 10 é o maior projeto portuário do país desde a criação do Porto de Suape.

Abrir a disputa para grupos que ainda não operam em Santos:

  • traz dinheiro novo,
  • amplia diversidade de operadores globais,
  • reduz a dependência de poucos conglomerados.

Mantém alternativa caso falte concorrência

Se a 1ª fase não atrair propostas, os incumbentes poderão participar, mas com uma condição dura: desinvestir seus ativos atuais em Santos.

O TCU criou um modelo que:

  • garante concorrência na 1ª fase;
  • impede concentração exagerada na 2ª;
  • protege o interesse público independentemente do cenário.

É um desenho regulatório raro no Brasil: firme, técnico e com salvaguardas claras.

Benefício direto ao agro e ao comércio exterior

O agronegócio depende de portos eficientes. Custos portuários representam até 25% do custo total de exportação em algumas cadeias.

Com um novo terminal:

  • o escoamento fica mais ágil,
  • o risco de “fila” nos picos de safra diminui,
  • exportadores ganham previsibilidade,
  • fertilizantes e insumos importados chegam com menor custo logístico.

Mais competição no porto = menos custo Brasil.

Quem poderá participar do leilão?

Pela regra aprovada, podem participar desde a 1ª fase: novos operadores sem terminal em Santos. Isso inclui armadores ou operadores com presença global, mas sem operação ativa no porto santista.

Entre os potenciais concorrentes internacionais (já citados pelo mercado):

  • PSA International (Singapura) – uma das maiores operadoras portuárias do mundo.
  • Hutchison Ports (Hong Kong) – gigante asiática com presença na América Latina.
  • Cosco Shipping Ports (China) – interessada em expansão no Atlântico.
  • ICTSI (Filipinas) – forte presença em mercados emergentes.
  • ONE – Ocean Network Express (Japão) – possível entrada via braço portuário.
  • DP World não pode na 1ª fase (já opera em Santos), mas pode aparecer na 2ª fase mediante venda de ativos.

No cenário doméstico:

  • CS Ports/CS Brasil (Grupo Simpar) – já demonstrou interesse em ampliar atuação logística.
  • Cooperativas de logística e fundos de infraestrutura também podem compor consórcios.

Estão proibidos na 1ª fase (mas podem na 2ª sob condições)

Todos os operadores incumbentes de contêineres no Porto de Santos:

  • MSC
  • Maersk
  • CMA CGM / Santos Brasil
  • DP World
  • BTP – Brasil Terminal Portuário

Para entrarem na 2ª fase, teriam de abrir mão de seus terminais atuais, condição que, na prática, dificulta bastante a participação

A decisão do TCU não resolve todos os problemas do Porto de Santos, muito menos os gargalos logísticos do Brasil. Mas representa um passo raro: colocar competição antes do conforto dos grandes grupos.

*Miguel Daoud é comentarista de Economia e Política do Canal Rural


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